Pesquisa feita na Universidade de São Paulo (USP) mostra
que o SARS-CoV-2, vírus causador da COVID-19, é capaz de infectar as células do
fígado (hepatócitos), estimulando a produção de glicose e provocando um quadro
semelhante ao de diabetes em pacientes internados – ainda que antes eles não
apresentassem alterações nas taxas de glicemia.
Os resultados do estudo, publicado ontem (15) na revista
Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), desvendam parte do
mecanismo que o vírus usa para infectar essas células, com impacto no
metabolismo da glicose, e apontam caminhos para tratamentos capazes de evitar o
agravamento do quadro clínico desses pacientes.
Os achados também sugerem que a entrada do vírus nos
hepatócitos é parcialmente mediada pela cooperação entre os receptores
(proteínas) GRP78 e ACE2, sendo que este último está presente na superfície dos
hepatócitos humanos como uma isoforma diferente, de baixo peso molecular, e com
o qual o SARS-CoV-2 se liga para viabilizar a infecção. Esse dado é uma das
inovações da pesquisa, já que trabalhos anteriores sinalizavam que células do
fígado não expressariam a proteína ACE2.
O alto nível de açúcar no sangue (hiperglicemia),
prevalente em pacientes hospitalizados com COVID-19, ocorre independentemente
do histórico de diabetes e está associado a um pior desfecho clínico, podendo
levar à morte. Desde o início da pandemia, em 2020, o diabetes foi apontado
como um fator de risco para pessoas com COVID-19, mas existiam lacunas em
relação aos mecanismos relacionados a esse quadro.
Publicações científicas anteriores chegaram a apontar que
pacientes com diabetes tipo 1 corriam risco de morte 3,5 vezes maior do que
aqueles com COVID-19 sem diabetes. No caso dos que sofrem de diabetes tipo 2, o
risco chegava a duas vezes mais.
“Fazer a ligação com os receptores GRP78 e ACE2 foi uma
espécie de ‘cereja do bolo’ do nosso trabalho. Mas o grande achado foi mostrar
que o SARS-CoV-2 é um causador direto da hiperglicemia, independentemente do
uso de corticoide, de estresse provocado pela hospitalização, do peso corporal
e de a pessoa ser diabética ou não. Demonstrar que o vírus é agente indutor
direto da hiperglicemia é um fato muito novo”, explica à Agência FAPESP Luiz
Osório Silveira Leiria, professor do Departamento de Farmacologia da Faculdade
de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) e autor
correspondente do artigo.
A pesquisa recebeu apoio da FAPESP e foi conduzida no
âmbito do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID), um Centro de
Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP.
A hiperglicemia (no caso do diabetes tipo 1) pode ocorrer
quando o sistema imunológico de um indivíduo ataca as células do pâncreas – que
“fabricam” insulina –, eliminando ou reduzindo a capacidade de produção desse
hormônio e provocando um desequilíbrio no metabolismo da glicose. Porém, os
pesquisadores detectaram que o pâncreas dos pacientes analisados estava
preservado. Por isso, passaram a avaliar o fígado que, entre suas funções,
extrai a glicose ingerida, armazenando-a em forma de glicogênio.
Fonte: Bahia
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